A REPRESENTAÇÃO LGBTQI+ NÃO IMPORTA?

Robert V. Ruggier (Unsplash)


Algum tempo atrás, eu postei um texto com o título A importância de personagens LGBT+ falando sobre a presença desses personagens na literatura e em mídias em geral como uma forma de mostrar nosso cotidiano também na ficção.
Com o tempo e o florescer de debates sobre gênero na internet, me veio à mente ideias primordiais para uma continuação daquele texto. Ao mesmo tempo em que via muitos escritores defendendo com unhas e dentes a presença de personagens gays e lésbicas, por exemplo, também era possível notar a presença “marcante” daqueles que se negavam a pôr um personagem em seus escritos por “cota”, por “não saber escrever” ou por simples desinteresse de representar uma sexualidade que não fosse a heterossexual.

E é sobre isso que vim tratar aqui.

O desinteresse pela sexualidade


É muito fácil alguém chegar e dizer que a sexualidade do personagem não é relevante, que “Isso não muda em nada na história” ou “O que importa é o enredo”. Essa pessoa pode estar certíssima — eu até concordo em parte —, dependendo do tipo de história que se quer contar.
Porém (e aqui há um gigantesco PORÉM), é notório que em toda história o escritor se preza em desenvolver a personalidade da sua personagem, seja ela não-binária, homem, mulher, criança ou velho. E com isso quero dizer que há um background, um pano de fundo, para a vida e existência daquela figura; e caso você não descreva todos os pontos importantes e essenciais para se criar um vínculo entre persona-leitor, o escritor perderá pontos.
E aqui entra a representatividade.
Quando você não menciona/descreve sobre a sexualidade do seu personagem, é senso-comum que independente de ser masculino ou feminino, automaticamente vamos vê-lo como heterossexual. Agora, se em algum momento, mesmo que você não diga “FULANO É VIADO/SAPATÃO”, se um de seus personagens demonstra afeição ou beija outro personagem de mesmo sexo, a representação se torna — em parte — real.
Ou seja, você não precisa passar metade da sua história dizendo que seu personagem é isso ou aquilo, basta apenas uma cena ou duas e um diálogo ou outro para mostrar um pouco mais da profundidade e das camadas que formam seu personagem.
Um exemplo disso, creio eu, é a personagem Shura (Diário Simulado), de Delson Neto. Ela é lésbica, tem uma namorada que ama, mas esse não é ponto central da narrativa, e sim as simulações e todo o ar de ficção-científica construída na cidade de neon que é Nova Avalon, onde se passa a história. Suas relações aqui, seja com a namorada ou com o irmão, por exemplo, só se tornam algo a mais, dando peso à protagonista.


“Deixei de ler LGBT por não ter hétero”


Ok, mas você já parou para pensar em todas os romances heterossexuais sem um LGBT? “Ah, mas não é o foco da narrativa”. Mas um romance puramente LGBT tem que ter um personagem hétero mesmo se não for o foco, então?
Sim? Não? Pera, dá para entrarmos em um consenso.
A meu ver, a importância da representatividade LGBTQI não está apenas em literatura de gênero, mas em como você aborda a vida de um personagem. Como mencionei acima, você não precisa rodar em torno da sexualidade, mas abordar isso de forma a dar sustância ao indivíduo da história.
Por exemplo, quando um romance (seja ele um terror, fantasia, sci-fi, etc) se utiliza desse “mecanismo” dentro de uma história heteronormativa, ajuda a construir uma certa empatia por personagens gays, lésbicas, trans e bissexuais. Torna comum a identidade de gênero.
Não há necessidade de eles serem ativistas o tempo todo (ainda que seja um tema importante a ser explorado), muito menos suas vidas precisam ser pautadas em cima da sexualidade, mas torná-los visíveis gera (ou pode gerar) uma melhor receptividade tanto na vida real, quanto na narrativa — ainda mais se o personagem se mostra LGBT e tem uma importância dentro do contexto da trama.
No fim das contas, não estou dizendo que é OBRIGATÓRIO colocar um personagem LGBTQI em sua história. Meu dever aqui é apenas pontuar e defender a importância desses personagens para representar uma sociedade cada vez mais diversificada — e como dizem que a arte imita a vida…
Agora, se você ficou interessade(o/a) sobre o tema, mas é do tipo que não escreve sobre gênero porque “não sabe”, então o meu próximo texto é para você, no qual falaremos sobre estereótipos e como fugir deles (ou não).

*
Fica aqui minha indicação de livros que abordam sexualidade de forma sublime:
Ordem Vermelha: Filhos da Degradação (fantasia), Felipe Castilho
Série A Rainha Vermelha (fantasia), Victória Aveyard
Série As Provações de Apolo e Magnus Chase e os Deuses de Asgard (fantasia), Rick Riordan
ShuraNada é real e Diário Simulado (ficção científica), Delson Neto
Ninguém Nasce Herói (ficção), Eric Novello
Todo Dia (ficção), David Levithan

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