Perdidos nos Mundos
Dizem
por aí que os personagens (principalmente protagonistas) sempre possuem alguma
coisa do autor. Claramente, eu não poderia negar tal coisa, afinal, Endrich
Ragrson, de Crônicas de Onyx, tem um
pouco de mim em seu lado sonhador, chatinho em ficar por fora dos assuntos
relacionados a ele (sim, sou desses), acolhedor e companheiro, quase sempre presente para os
amigos – da mesma forma que Maxon Carter tem a pior parte de mim. Diferente de
hoje, quando o personagem surgiu em minha mente lá por volta de 2011, ele transpira tudo que havia em mim: a inocência, o carinho para com o próximo, as incertezas
da adolescência e de ter que crescer mais rápido do que esperado; eu em
processo de amadurecimento, ele em ter que escolher uma vida imortal defendendo
seu mundo ou simplesmente morrer.
Bem
simples assim.
Mas
o tempo passa, a gente cresce, de criança para adolescente e deste para adulto.
Tudo muito rápido, tudo muitas vezes sem explicação. Onde está meu Manual de
Como Ser Adulto? E junto desse crescimento, amadurecemos, ideias se fixam,
outras esquecemos, sonhos se tornam projetos, projetos se tornam realidade,
nossa mentalidade se aprimora e, consequentemente, às vezes perdemos parte de
nossa inocência e até do que somos. Isso
que estou tendo é uma crise existencial? Muitas vezes me questionei isso, procurando
meu lugar no mundo, o que eu estava fazendo aqui, para onde deveria seguir. Será que sou tão importante para alguma
coisa ou a vida é simplesmente um amontoado de eventos sem nexo?
Eu
não acredito mais que sejamos eventos aleatórios sem um fio condutor. O mundo
não está aí simplesmente por estar. E David, um dos protagonistas de A Relíquia da Vida, também acredita, passa a acreditar em seu destino, mesmo
que esteja perdido em um mundo desconhecido, um lugar que sequer imaginou existir.
Sendo o Escolhido de Vita, ele precisa fazer uma escolha que pode mudar o rumo
dos eventos em Onyx, e, hoje, vejo essa situação dele como uma metáfora ao que
eu mesmo estava passando. Não é fácil quando você está naquela fase da
juventude em que você não sabe por onde caminhar. Eu realmente estou no mundo
certo? Na família certa? Afinal, às vezes me sentia tão estranho (e ainda me
sinto) perto dos meus parentes, que algo sempre pareceu errado.
Mas
o certo e o errado não são definições exatas.
A
questão é que se David estava perdido em Onyx, eu estava perdido na Terra. E
talvez escrever sobre outro mundo no qual a fantasia, magia, cavaleiros,
arqueiros e toda a sorte de seres míticos e místicos são possíveis sem grande
estranhamento, se deva ao fato de eu querer fugir da sociedade na qual seria
taxado de “anormal”. E como se isso não
fosse suficiente, há uma passagem no livro que nosso viajante se pega
questionando sobre quem é, quais os seus desejos e o que significa se sentir
atraído por uma garota ou um garoto. Todos os questionamentos que, sem
perceber, eu mesmo estava me fazendo. Eu havia chegado em uma bifurcação, uma
encruzilhada, e não sabia por onde seguir e se aquilo realmente seria certo.
Assim
como David, eu me indaguei, pesei prós e contras, busquei apoio e força em
amigos – como todo adolescente precisa em momentos de crises e dramas, como
toda pessoa precisa em momentos conturbados. E assim como David, eu escolhi. Eu
escolhi ser feliz, ele escolheu o que achou certo para o mundo. Nós nos
colocamos em posições que poderiam (e podem) nos matar e, também, nos trazer
alegrias – e quem sabe esse seja o motivo pelo qual, a meu ver, David seja o
personagem que mais tem de mim. Nós escolhemos e, mesmo que ainda estejamos por
vezes perdidos nos mundos, isso não nos impedirá de seguir em frente.
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