Conto: A Caneta de Prata - Parte 1
Olá, pessoal, tudo bem? Eu sei que estou há séculos sem postar nada novo, mas é que a faculdade me sugou nas últimas semanas, mas pelo menos o evento que estávamos promovendo foi um sucesso e tirei nota máxima na matéria de Eventos (dancinha da vitória). Bem, hoje trago a primeira parte de um conto que escrevi há alguns meses para um concurso que, infelizmente, não passou. Para não deixá-lo engavetado, vou postar primeiro aqui. Futuramente irá para o Wattpad, mas até lá...
A Caneta de Prata
Parte 1
Israel olhou
para a caneta tinteiro através da vitrine. Era tão bonita! Sua cor prateada com
detalhes em dourado chamaram-lhe atenção. Resolveu adentrar na loja e perguntar
o preço. Assim que foi atendido pela moça, a resposta à sua indagação:
— Custa R$570.
Seus olhos se esbugalharam. Como uma caneta pode ser tão cara?!
— Mas ela é uma joia rara. É uma peça de
colecionador, muito especial — comentou a atendente.
— Ah, sim, imagino…
Ele não queria admitir, mas estava
encantado pela graciosidade daquela peça. Uma caneta como aquela não devia ser
vista em qualquer lugar. Pediu para pegá-la e a moça atendeu-o, entregando-lhe
a caneta assim que a retirou de seu pedestal. Tocando aquele objeto, Israel sentiu
que precisava escrever com ela. Ele necessitava
tê-la consigo. Mas por quê?
— Não tem como fazer mais barato? —
indagou.
A moça trocou o peso de um pé para
outro. Pediu licença e foi falar com seu superior. Após alguns minutos ela
retorna — e nesse meio tempo o jovem homem teve a certeza de que queria mais
que tudo aquela caneta.
— O preço mínimo que posso fazer é
R$520 — falou a mulher.
Suspirando, resignado, Israel
respondeu:
— Ok, então — e entregou a caneta
nas mãos da atendente. — Vocês aceitam cartão de crédito?
Cinco minutos depois, Israel estava
com sua nova caneta de colecionador guardada numa caixinha estofada muito
bonita. Ele não entendia o porquê se sentira tão atraído por aquele objeto. Não
pensaria nisso, afinal, pagara uma fortuna por ela. Chegaria a sua casa e a
colocaria em uso imediatamente.
E foi exatamente o que fez.
Largou a mochila cheia de papéis de
sua empresa sobre o sofá e dirigiu-se para o mezanino da ala escritório — nada
mais que uma mesa encostada na parede, num dos cantos da sala. Pegou seu
caderno de anotações, na verdade um diário, e começou a pôr as ideias no papel
e descreveu sobre sua nova aquisição. Em sua mente, vários pensamentos se
chocavam, deixando-o levemente perturbado.
Suspirando, pegou um papel qualquer
sobre a mesa e escreveu “Água”. Imediatamente um copo cristalino cheio de água
se materializou na sua frente. Olhou admirado e assustado para o feito.
Ergueu-se rapidamente da cadeira e deu um passo para trás, deixando a caneta de
prata sobre a mesa, largada. Apesar do sobressalto, sentia que devia ainda
ficar com a caneta e não temê-la.
Mais uma vez pegou-a entre as mãos.
Analisou e então escreveu novamente com ela: “Sanduíche”. E seu pedido foi
realizado. Com um sorriso no rosto, pegou o lanche de cima da mesa e
experimentou.
— Hm, que delícia! — falou em voz
alta.
Tocou a caneta no papel.
“Refrigerante de guaraná”. O copo de água tremeluziu e o líquido escureceu,
tornando-se refrigerante. Sua expressão maravilhada mostrava o quanto estava cada
vez mais entusiasmado para descobrir o que estaria acontecendo. Seria possível
a caneta realizar qualquer desejo seu?
––––
Os dias se
passaram rapidamente, e Israel estava cada vez mais impressionado com o poder
daquela caneta. Pegou-se por vezes se indagando se aquilo não seria coisa de
sua cabeça, mas imaginação não traria copos de cerveja, lanches quentes e
outras coisas mais. Isso só podia ter uma explicação: magia.
Estaria ele certo?
Israel levantou num de seus dias
comuns e caminhou até a cozinha. Encontrou a caneta de prata jogada sobre o
bloco de notas no qual fazia suas anotações mágicas.
Escreveu “camiseta branca de polo” e uma muda de roupa se materializou na sua
frente. Pegou a roupa e vestiu sobre o peito nu. Após tantos dias sentia ser
capaz de fazer qualquer coisa com a caneta. Melhorara até mesmo em sua empresa.
Mesmo assim, por que se sentia tão vazio?
Após um exame rápido, percebeu que
algo de estranho acontecera assim que escrevera seu pedido. As palavras estavam
sumindo da página branca do bloquinho. Folheou e então percebeu o que vinha
acontecendo: todas as folhas estavam brancas iguais a velas — ou simples folhas
brancas. Vasculhou rapidamente cada página em busca de uma marca da caneta.
Nada encontrou. Todas as palavras, pedidos que fizera, simplesmente haviam
desaparecido.
Sua cabeça começou a procurar uma
explicação para aquilo. Entretanto, nada se encaixava como teoria. Afinal, até
mesmo aquela caneta não se encaixava no que parecia ser certo. Vazio. Por que a sensação de vazio
parecia aumentar gradativamente?
Olhou para o relógio. Nove horas da
manhã. Suspirou e resolveu fazer a única coisa que lhe convinha num final de
semana.
Sem usar a caneta, tomou um rápido
café, trocou de roupa e se dirigiu ao carro. Minutos depois estava descendo a
avenida principal da cidade até a casa de seus pais. Ao chegar lá, bateu à
porta, mas ninguém o atendeu. Olhou em volta. O silêncio predominava. Dando
meia-volta na casa, dirigiu-se ao pátio dos fundos. Antes que seus olhos
tocassem a imagem, o cheiro denunciou que algo estava estranhamente errado.
Tapou o nariz e deu mais alguns passos. Foi então que tudo pareceu parar a sua
volta. Não havia mais ar, não havia mais pressão prendendo-lhe ao chão. Nada
mais existia senão aquela imagem. Uma imagem aterrorizante.
Com cordas grossas envoltas nos
pescoços, os pais de Israel pendiam há alguns metros do chão pendurados num
galho da árvore do quintal. Seu corpo tremeu de terror e angústia, sua cabeça
inquiria os motivos que levaram os dois a fazerem tal coisa. Antes que sua
mente pudesse estabelecer alguma resposta, seus dedos formigaram e correram
para a caneta de prata. Sem saber exatamente por que estar fazendo aquilo, o
homem catou o objeto do bolso da calça e se dirigiu ao homem pendurado.
Lágrimas escorreram de seus olhos e suas mãos, trêmulas, se ergueram na altura
de sua testa. Quando a ponta da caneta tocou a pele roxa do homem, seu braço se
moveu, e só então percebeu que algo estava sendo escrito: “Fale”.
Sem abrir os olhos, a boca do velho
homem se mexeu. Israel deu dois passos atrás e ouviu a voz rouca e gutural que
saia de sua boca:
— Ora, meu jovem Israel, não tenha
medo. Não lhe farei mal, meu filho, sabe disso. — Uma tosse irrompeu, fazendo-o
se arquear para frente, balançando-se na corda, e logo voltou ao estado de
inercia. — Sua mãe e eu não sabemos ao certo o que aconteceu. Mas algo nos
dizia que devíamos fazer isso. Você se tornou um homem de responsabilidade
agora.
— Não estou entendendo — replicou
Israel.
— É simples — e apontou para a
caneta em suas mãos —, você possui uma das coisas mais poderosas capaz de mudar
o mundo. Você é um escolhido da caneta dos desejos.
Israel o fitou por um momento, ainda
sem compreender. Bufou.
— Você já deve ter ouvido: “com
grandes poderes, vêm grandes responsabilidades”. Isso significa que você deve
tomar cuidado.
De súbito, a mão de Israel se ergue
na altura da testa de sua mãe. Assim que escreveu “Fale”, a palavra tornou a
desaparecer lentamente.
— Ora, simplesmente morremos por
causa disso — reclamou ela, a voz que um dia fora sedosa, agora parecendo cacos
de vidro rasgando ossos quebradiços, e apontou para o objeto nas mãos de seu
filho. — Você sempre acha que seus problemas são maiores que os demais. Acha-se
superior a todo e qualquer um. Você precisa enxergar que não é bem assim!
— O que quer dizer?
— Que a caneta só lhe escolheu para
você mudar — respondeu seu pai.
— Só que para você enxergar o
sofrimento de verdade e sentir o peso da realidade sobre os ombros foi
necessário um sacrifício (nem tanto de livre e espontânea vontade), mas
suficiente para você ver que nem tudo gira em torno de você.
— Quê? Mais que absurdo!
— Ora, você tem que ver que nem tudo
vem de graça. Que as coisas não são tão simples! — bravejou sua mãe.
Israel levou um choque de realidade.
Nada vem de graça, tudo tem um preço. Baixou os olhos para as mãos trêmulas,
fitando a caneta. Por que eu a escolhi? —
perguntou-se, a raiva borbulhando em seu interior.
— Isso tudo é apenas para me dar uma
lição de moral?
— Que bom que percebeu isso — ralhou
seu pai, os olhos rodando nas órbitas sob as pálpebras.
— E precisavam se matar?!
— Como dissemos — interveio sua mãe —,
foi um sacrifício nem tanto de boa vontade. É necessário perder coisas para
ganhar outras.
Israel fitou seus pais antes que
suas bocas se fechassem e as palavras escritas em suas testas desaparecessem de
vez. Sua mão tremeu, seus pensamentos estavam correndo desesperadamente, queria
que aquilo tudo desaparecesse, que seus pais não estivessem ali. A caneta de
prata carregou sua mão ao corpo dos pais e escreveu mais uma vez em cada testa:
“Desaparecer”. Assim que escreveu a última letra na segunda palavra, os corpos
roxos tremeluziram e rapidamente desapareceram. As únicas coisas que se mantiveram
no lugar foram as cordas pendendo no galho da árvore.
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